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Dr. Ranieri Esclarece
Dr. Ranieri Esclarece

Da Pirâmide ao Pichardo. Não entendeu nada? Chegou a hora!

27/05/2022 às 14:03

Quando se fala em faraó, a primeira imagem que provavelmente vem a sua cabeça é uma pirâmide do Egito, mas certamente para algumas pessoas, pirâmide, significa prejuízo. Alguns lugares do Brasil são até mesmo conhecidos por Novo Egito, a terra das pirâmides, que, na verdade, são miragens, ilusões, que levam àqueles que acreditam ao  deserto do desapontamento, onde terão prejuízos enormes. 

A operação de pirâmides financeiras pode ser classificada, na maioria das vezes, como delito contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei 7.492/1986), para outros, o crime estaria previsto no art. 2º, inciso IX, da Lei 1.521/1951, fato é que se considera uma infração. 

Nesta forma, a pirâmide seria uma infração penal de menor potencial ofensivo, com pena baixa, de 6 meses a 2 anos, e multa, sujeito a julgamento pela Justiça Estadual.  Porém, se cometida em concurso, ou seja, de forma simultânea com o delito previsto na Lei 7.492/1986, teríamos a competência da Justiça Federal, como no caso TelexFree. 

Aliás, o inciso IX do art. 2º, é crime contra a economia popular obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante  especulações. Por exemplo, desta modalidade seria a do crime de cambismo fora de competições esportivas, vejam que há uma diferenciação. 

Também é crime contra a economia popular, conforme a segunda parte do inciso IX do art. 2º da Lei 1.521/1951, obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou  de número indeterminado de pessoas mediante processos fraudulentos. Uma exemplificação vem na sequência: “bola de neve”, “cadeias”, “pichardismo” e quaisquer outros equivalentes. 

Nunca me deparei com um caso de “pichardismo”, aliás nunca tinha ouvido falar. Curioso, busquei informações. Na maioria das vezes, menciona-se que esse apelido resultado do nome do golpista italiano Manuel Severo Pichardo, boa parte dos estudiosos dizem que, o golpe consistiria na promessa fraudulenta, ao comprador, do fornecimento de determinada mercadoria e, após algum tempo, da restituição do valor pago. 

A primeira informação que encontrei foi no habeas corpus 34.071, julgado em 11 de maio de 1956, no qual se discutiu a competência do júri em relação ao pichardismo. Um pouco mais a fundo, o pichardismo apareceu como crime no inciso III do art. 3º do Decretolei 869/1938: “obter ou tentar obter ganhos ilícitos, em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas, mediante especulações ou processos fraudulentos (“bola de neve”, “cadeias”, “pichardismo”, etc.)”, então punido com prisão de 6 meses a 2 anos e multa. 

Em busca ainda mais profunda encontrei o caso contra o famigerado Manoel Severo Pichardo García, que deu nome ao crime tipificado na Lei 1.521/1951. Seu nome não era “Manuel”; era “Manoel” com “o” e os autores que a ele fazem referência sempre deixavam de fora seu último sobrenome, García – o diabo mora nos detalhes. 

Das transcrições encontradas, Pichardo, como era mais conhecido, sequer era italiano; era mexicano - detalhes - e já havia apresentado o seu sistema de “vendas reintegrativas” (esse era o seu método comercial) nos Estados Unidos, no Peru e no Chile, países onde exerceu o comércio, antes de chegar ao Rio de Janeiro. O processo datado de 17 de maio de 1909, junto à 3ª Vara Criminal do Distrito Federal, imputou a Pichardo García o crime de estellionato (o português muda junto com a sociedade), então tipificado no art. 338, §5º, do Código Penal de 1890. 

O Resultado? O juiz não considerou crime “a simples prática do sistema reintegrativo, por consistir este em um verdadeiro pacto entre o comerciante e o freguês, e não um artifício doloso empregado por aquele para enganar a este” os autos são claros. Clientes de Pichardo, ficaram no prejuízo, aliás ficaram a ver a miragem da partida dele para Europa, após ser liberado pela Justiça Brasileira, como de fato deveria, afinal, Manuel, não é Manoel, nem mesmo um italiano se trata de um mexicano, por certo. 

Certo é que, Pichardo aqui deixou uma lição de pichardismo, clássico de fato, reinventado, remodelado, por novas gerações de Pichardos tupiniquins, quiçá por suas próprias vítimas, buscando reduzir suas perdas em detrimento alheio. Milagres, especialmente o da multiplicação, são feitos de divindade. Capisci?

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Ranieri Peixoto, advogado criminalista, formado  pela Universidade do Planalto Catarinense, Pós Graduado em Direito Constitucional e Direito Público com Ênfase no Ministério Público Federal. Atuou no Ministério Público de Santa Catarina por mais de 5 anos, proprietário do Escritório Ranieri Peixoto Advogados, atuante em todo o Estado de Santa Catarina, especialmente nos Municípios Xanxerê e Chapecó. Instagram: @criminalistaranieripeixoto. Site: www.ranieripeixotoadvogados.com. Whatsapp:49984183100.

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